E SE FOSSE VERDADE

Adaptada do livro de: Marc Levy

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Capitulo 2 - Grandeee

Vanessa se encantava em ver o amanhecer na estrada que, bordeando o Pacífico, une São Francisco com a baía de Monterrey. Ainda sonolenta, procurou o botão para desligar o despertador. Esfregou os olhos com as mãos fechadas e dedicou o primeiro olhar a Karli, estendida sobre a almofada. -- Não me olhe assim! Já não faço mais parte deste planeta — Ao ouvir sua voz, a cadelinha se apressou a rodear a cama e apoiou a cabeça no ventre de sua dona. – Vou deixar você, dois dias, querida. Mamãe passará para buscá-la às 11. Afaste-se um pouco, vou me levantar e dar algo para você comer. Vanessa esticou as pernas, deu um grande bocejo esticando os braços para cima e saltou da cama com os pés juntos. Passou por trás do balcão, esfregando a pele, abriu a geladeira. Bocejou novamente e pegou manteiga, marmelada, torradas, uma lata de comida para cães, um saco aberto de queijo de Parma, um pedaço de Gouda, uma garrafa de leite, um vidro de compota de maçã, dois iogurtes naturais, cereais e meio grapefruit; a outra metade ficou na parte inferior. Como Kali a observava, movendo a cabeça, Vanessa a olhou com cara de tédio e disse: —Tenho fome! Como de costume, preparou primeiro o café de sua cadelinha em uma pesada tigela de barro.
Continuando, pegou sua bandeja e a levou para a mesa de trabalho. Dali, girando ligeiramente sua cabeça, podia ver Sausalito e suas casas suspensas nas colinas, o Golten Gate que unia os dois lados da baía, o porto de pesca de Tiburon, e, a seus pés, os telhados que se extendiam, escalonados, até La Marina. Abriu a janela de para em par. A cidade encontrava-se em silêncio: apenas as sirenas dos navios com destino à China. Misturadas com os gritos das gaivotas, acompanhavam a moleza da manhã. Esticou-se novamente, e, com apetite, atacou o banquete sobre a mesa. A noite anterior não tinha jantado por falta de tempo. Por três vezes tentara comer um sanduíche, mas interrompera, pois a chamavam para atender “urgência”. Quando era apresentada a alguém e perguntavam-lhe a que se dedicava, respondia, invariavelmente: “A Correr”. Depois de haver devorado boa parte do café, deixou a bandeja e se dirigiu ao banheiro. Introduziu os dedos entre as lâminas de madeira da persiana, para incliná-las, deixou cair no chão o roupão de algodão e entrou na ducha. O jarro potente da água temperada acabou de despertá-la. Ao sair da ducha, enrolou-se em uma toalha, deixando as pernas e pés livres. Fez uma careta em frente ao espelho e decidiu-se por uma maquiagem ligeira. Colocou jeans e uma blusinha, tirou os jeans, colocou uma saia, tirou e colocou novamente os jeans. Tirou do armário uma bolsa de lona, colocou algumas coisas e a nécessaire na mesma, e considerou que estava prontinha para começar o fim de semana. Ao virar-se viu a desordem reinante – roupas espalhadas no chão, toalhas, cama desfeita – e disse em voz bem alta, com determinação, dirigindo-se a todos os objetos do lugar: —Nem uma palavra! Nem reclamação! “Amanhã estarei de volta e os arrumarei para toda a semana”. Pegou papel e caneta e redigiu uma nota, antes de pregá-la na porta do geladeira com um grande ímã em forma de rã. Mamãe: Obrigada por tomar conta da cadelinha. Não precisa arrumar nada. Vou fazê-lo quando regressar. Passarei diretamente em sua casa para pegar a Kali, no domingo até as cinco. Com amor Sua doutora preferida. Colocou o casaco, acariciou a cabecinha da cadela, a beijou e saiu de casa. Desceu os degraus da grande escadaria, saiu em direção à garage e de um salto se colocou dentro do velho conversível.
— Lá vou eu, lá vou eu, — se repetia — Não posso acreditar, é um verdadeiro milagre. A única coisa que falta é que você se digne a arrancar. Se você falhar uma só vez, pode se preparar. Eu vou afogá-lo em xarope, antes de levá-lo ao desmanche e vou trocá-lo por um carro novo, totalmente eletrônico,
sem afogador e sem achaques quando fizer frio pela manhã! Você compreendeu bem? Espero que sim!! Contato!! O velho inglês parece ter se impressionado enormemente com a convicção de sua dona ao pronunciar aquelas palavras, pois seu motor pegou com o primeiro giro da chave. Um belo dia se anunciava.
Vanessa arrancou lentamente para não despertar a vizinhança. Green Street é uma bonita rua, bordeada com árvores e casas. Os que ali vivem, conhecem-se uns aos outros, como nos povoados. Seis cruzamentos antes de chegar a Van Ness, uma das grandes artérias que atravessam a cidade, mudou a marcha e acelerou. Uma luz clara, que mudava de cor à medida que transcorriam os minutos, despertava pouco a pouco as perspectivas deslumbrantes da cidade. O carro ia bem veloz, por ruas desertas. Vanessa saboreava a embriaguez daquele momento. As costas de São Francisco são particularmente propícias para experimentar uma sensação de vertigem. Volta fechada em Sutter Street. São seis e meia, o cassete reproduz música ruidosa. Faz muito tempo que Vanessa não se sente tão feliz. Deixou para trás o estresse, o hospital, as obrigações. Anuncia-se um fim de semana completo para ela e não quer perder um minuto sequer. Union Square está tranqüila. Horas mais tarde, as ruas se encherão de gente da cidade e de turistas que irão às compras. Agora, reina a calma. Os letreiros das vitrinas estão apagados, alguns mendigos dormem nos bancos. O guarda do estacionamento deixa um sonho na guarita. El Triumph engole o asfalto no ritmo dos impulsos da mudança de marchas. Os sinais estão verdes. Vanessa reduz para segunda, para contornar melhor Polk Street, uma das quatro ruas que bordeiam a praça ajardinada. Embriagada com um lenço na cabeça, começa a girar diante da imensa fachada do edifício de Macy´s. Uma curva perfeita. Os pneus chiam ligeiramente, sucedem-se os barulhos, tudo vai muito depressa. Um estalido repentino! O tempo se detém. Já não há diálogo entre a direção e os pneus, a comunicação interrompeu-se definitivamente. O carro vai para um lado e derrapa na calçada bastante úmida. O rosto de Vanessa se contrai. Suas mãos agarram o volante que se voltou dócil e aceita girar sem fim, em um vazio que compromete o resto do dia. El Triumph continua patinando, o tempo parece acalmá-lo e estirar-se de repente como num grande bocejo. Dá voltas na cabeça de Vanessa; na realidade é o cenário que gira ao redor dela com uma velocidade incrível. O carro se parece com um pião. As rodas se chocam brutalmente contra a calçada, o morro se levanta e beija uma boca de incêndios. O capô eleva-se até o céu. O carro gira sobre ele próprio num último esforço e expulsa a motorista, pois é muito pesada para a pirueta que desafia as leias da gravidade. O corpo de Vanessa sai pelos ares e se espatifa contra a fachada do grande armazém... O velho Triumph termina sua carreira caindo, boca acima, com parte sobre a calçada. Um pouco de vapor escapa de suas entranhas e exala o último suspiro, seu último capricho de velho inglês. 



Brigadinha pelos coments....adorei....(:
ateh o proximo....beijjuuusss

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