E SE FOSSE VERDADE

Adaptada do livro de: Marc Levy

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Capitulo 3

Vanessa está inerte. Descansa placidamente. Seu semblante está sereno, sua respiração é lenta e regular. Na boca, ligeiramente aberta, poderia descobrir-se um leve sorriso. Tem os olhos fechados, como se estivesse dormindo.Os cabelos longos emolduram o rosto. A mão direita, apoiada no ventre. Na guarita, o guarda do estacionamento pestaneja. Viu tudo, como num filme, mas ali, era real, dirá. Levanta-se, sai correndo, troca de opinião e retorna. Disca febrilmente o telefone para 911. Pede ajuda, e a ajuda se põe em marcha. O restaurante do Hospital San Francisco é grande com piso branco e paredes pintadas de amarelo. Uma grande quantidade de mesas retangulares de fórmica acham-se dispostas ao longo de um corredor central que conduz às máquinas de bebida e comida embalada a vácuo. O doutor Philip Stern cochilava, sobre uma das mesas, com uma xícara de café frio na mão. Um pouco mais adiante, seu companheiro se balançava numa cadeira, com o olhar perdido no vácuo. No fundo de um de seus bolsos sonhava a busca. Abriu um olho e fitou o relógio... faltava apenas um quarto de hora para terminar o plantão. —Estou com azar, Frank, veja o que está acontecendo. Frank pegou o telefone mural que tinha sobre sua cabeça, escutou a mensagem que uma voz transmitiu, e virou-se para Stern —Vamos, amigos, é para nós!!. Union Square, um código 3, parece que é grave... Os dois internos designados para o serviço de plantão se levantaram e dirigiram-se para o lugar onde os esperava a ambulância, com o motor ligado, ao pé da rampa luminosa intermitente. Dois toques breves de sirena marcaram a saída da unidade dois. Eram sete menos um quarto da manhã. Market Street estava totalmente deserta e o veículo circulava com muita velocidade. —Merda! E pensar que hoje vai fazer um bom dia.. —Por que se queixa? —Porque estou arrebentado. Vou passar o dia dormindo, sem poder aproveitá-lo. —Vira à esquerda. Seguiremos pela contramão. A ambulância seguiu por Polk Street até Union Square. —Ali está. Ao chegar à grande praça, o que primeiro viram os dois internos foi o velho Triumph chamuscado. Frank parou a sirena. —Pois sim, foi em cheio —constatou Stern, descendo do veículo. . Dois policiais já estavam ali, e um deles conduziu Philip até a vitrina quebrada. —Onde está? — perguntou o interno ao policial. —Ali. É uma mulher e é médica,parece-me que de emergências. Talvez a conheçam..
Stern, ajoelhado junto ao corpo de Vanessa, pediu aos gritos ao seu companheiro que se apressasse. Já havia cortado com tesouras, os jeans e o
jersey, deixando a pele respirar. Na perna esquerda, uma grande deformação, com um grande hematoma, indicava uma fratura. O resto do corpo, aparentemente, estava sem contusões. —Prepara-me as chapas e a perfusão. O pulso escapa e não há tensão, respiração a 48, ferida na cabeça, fratura no fêmur direito, com hemorragia interna. A Conhecemos? É do hospital? —Sim, eu já a vi. É interna em plantões, trabalha com Fernstein. É a única que tolera ele. Philip não teve reação diante desta última observação. Frank colocou as sete placas (radiografias) sobre o peito da jovem, uniu cada uma delas com l fio elétrico de cor diferente do eletro portátil e o conectou. A tela se iluminou. —O que se vê? — perguntou seu companheiro.. —Nada bom. Tensão a 8/6, pulso a 140, lábios cianóticos. Prepare uma sonda endotraqueal de 7, vamos intubar. O dr. Stern acabava de colocar o catéter e estendeu o frasco de soro a um policial. Segure bem! Necessito suas duas mãos. Continuando, pediu a seu companheiro que injetasse 5 mgs de adrenalina no tubo e 125 mgs de Solumedrol, e que preparasse imediatamente o desfibrilador. No mesmo momento, a temperatura de Vanessa começou a baixar rapidamente, enquanto o eletrocardiograma mostrava-se irregular. Na parte inferior da chapa verde, começou a bater um pequeno coração, acompanhado por um sinal curto e repetitivo, sinal de aviso da iminência de uma fibrilação cardíaca. —Vamos,querida, fique conosco!! Deve estar inundada de sangue por dentro. Como está seu ventre?! —Brando. Provavelmente sangra na perna. Você está preparado para a intubação? Em menos de um minuto, Vanessa estava entubada. Stern perguntou pelas constantes; Frank disse que ela respiração estava estável e que a tensão tinha baixado a 5. Não teve tempo de terminar a frase. O sibilar curto foi substituído por um som estridente que saiu do aparelho. —Já começamos..., está fibrilando. Manda-me trezentos... O corpo arqueou-se brutalmente pelo efeito da descarga, com o ventre apontando até o céu, antes de cair de novo. —Não, não foi bem. . —Coloque a 360. tentaremos novamente —Já está. 360. —Segure-os! O corpo se ergueu e de novo caiu inerte. —Passa-me mais 5mgs de adrenalina e torna a carregar 360. Vamos!! Outra descarga, outro sobressalto. Outra descarga, outro sobresalto. —Siga, fribilando. Perdêmos-na. Injeta uma unidade de Lidocaína na perfusão e volta a carregar Já!!!! O corpo elevou-se.
—Injetemos 500mgs de Berilium e carga a 380, imediatamente. Vanessa sofreu nova sacudida. Seu coração parece ter respondido bem às drogas que foram injetadas e recobrou um ritmo estável, mas só por alguns instantes. O barulho do sibilo retornou. —Parada cardíaca! —disse Frank. Philip começou imediatamente uma massagem cardíaca com uma obsessão pouco habitual. —Não se faça de boba, suplicou enquanto tentava devolver-lhe a vida – hoje faz um lindo dia. Não nos faça isso. Depois, ordenou a seu companheiro que carregasse novamente a máquina. —Deixa, Philip — disse Frank, tratando de acalmá-lo —, é inútil. Mas Stern se negava a abandonar; repetiu a seu companheiro que carregasse o desfibrilador e este obedeceu. Uma vez mais descarregaram. O corpo tornou a voltar, mas o eletro seguia. Philipe reiniciou a massagem com a fronte banhada em suor. O cansaço acentuava o desespero do jovem médico ante sua impotência. Seu companheiro tomou consciência de que sua atitude não tinha lógica. Deveria ter parado vários minutos antes e ter certificado a hora do falecimento, mas não o fazia, continuava massageando o coração. —Coloque mais meio mg de adrenalina e sobre a 400. —Philip, pare já. Não tem sentido. Está morta. Você não sabe o que faz... O policial olhou o interno ajoelhado junto a Vanessa inquisitivamente, mas este não lhe prestou qualquer atenção. Frank deu de ombros e voltou a carregar o desfibrilador e anunciou o umbral de 400 mgs. Stern enviou a descarga, sem sequer pedir que segurassem. Sacudido pela intensidade da corrente, o tórax se ergueu bruscamente. A linha permaneceu plana. O interno não a olhou, sabia, antes de aplicar esta última descarga. Golpeou com o punho o peito de Vanessa. —Merda! Merda! Frank o agarrou pelos ombros com força... —Pare, Philip, você está perdendo as chapas, acalme-se!! Ateste o falecimento e vamos embora. Você já não pode mais. Tem que ir descansar. Philip estava suando e tinha o olhar perdido... Frank levantou a voz e segurou a cabeça do amigo entre as mãos, obrigando-o a olhá-lo nos olhos. Ordenou-lhe que se acalmasse, e, em vista de que parecesse não raciocinar, esbofetou-o. O jovem médico reagiu. —Vamos, amigo, fique tranqüilo —insistiu seu companheiro, num tom de voz deliberadamente apaziguador. Logo, fatigado, soltou-o Os policiais contemplavam os dois médicos estupefatos. Franka caminhava dando voltas sobre si mesmo, totalmente desconcertado, a julgar pelas aparências. Philip, ajoelhado, levantou lentamente a cabeça, e disse em voz baixa:
—Hora da morte, sete e dez. Levem-na! — dirigindo-se ao policial que segurava o frasco – acabou-se. Não podemos fazer mais nada por ela. –
Levantou-se, passou um braço pelos ombros do companheiro e o conduziu até a ambulância. – Vem, vamos! Os dois agentes os seguiram. —Não me pareceu que já tivessem tido outros casos assim! Comentou um deles. O outro policial olhou para seu colega. —Você já viu algum caso em que se tenha encarregado um de nós? —Não. —Pois então você não pode compreender o que acabam de viver. Vem, ajuda-me. Vamos colocá-la com cuidado sobre a maca e no furgão. A ambulância já havia dobrado a esquina. Os dois agentes levaram o corpo inerte de Vanessa, depositaram-no sobre a maca e o cobriram com uma manta. Com o fim do espetáculo, os curiosos que tinham ali permanecido, se foram. No interior da ambulância, os dois médicos permaneciam calados, até que Frank perguntou: —O que aconteceu com você, Philip?? — Não tem sequer trinta anos, é médica, é bela... —Sim, mas não se trata disso!! Muda as coisas o fato de que seja bela e médica? Poderia ter sido feia e trabalhar em um supermercado. É o destino. Você nada pode fazer para evitá-lo, havia chegado a hora dela. Agora, voltaremos, você irá descansar e tentar esquecer o ocorrido. Dois quarteirões atrás deles, o carro de polícia se dispunha a passar por um cruzamento, quando um taxi ultrapassou o sinal. O policial, furioso, freou bruscamente e ligou a sirena por instantes; o motorista de Limo Service parou e pediu desculpas. O corpo de Vanessa havia caído da maca. Os dois homens passaram para a parte posterior. O mais jovem segurou Vanessa pelos pés e o maior pelos braços. O último parou, petrificado, ao reparar no peito da jovem. —Respira! —Como??!!!!? —Respira!!! Pegue o volante agora mesmo e vamos ao hospital. —Você se dá conta??? Já dizia eu que aqueles médicos não estavam bem. Que confusos!! —Cale-se e apresse-se. Nada entendo, mas eles dois vão ouvir falar de mim... O furgão da polícia adiantou-se com uma chamada à ambulância, face ao olhar atônito dos dois internos. Eram “seus policiais”. Philip queria que seu companheiro que também conectara a sirena os seguisse, mas este se opôs. Estava esgotado. —Por que iam tão depressa?? —Não tenho idéia – respondeu Frank -. Além do que, pode ser que não fossem eles. Todos se parecem. Dez minutos mais tarde estacionavam ao lado do furgão policial, cujas portas haviam sido deixado abertas. Philip saiu da ambulância e entrou na emergência. Encaminhou-se com passos cada vez maiores à recepção. —Em que sala está? —perguntou recepcionista sem cumprimentá-la.
—Quem, dr. Stern? — indagou a enfermeira. —A moça que acabam de trazer... —Na sala cirúrgica 3. Está sendo atendida por Fernstein. Parece que é de sua equipe. O policial mais velho aproximou-se e tocou seu ombro. —Pode-se saber o que vocês têm na cabeça? —Perdão!!?? Fazia bem em pedir perdão, mas não bastava. Como podia ter certificado o falecimento de uma moça que ainda respirava?? —Se não fosse por mim, a teriam metido viva na geladeira!! Sim, desde cedo, iria ouvir falar dele. O Dr. Fernstein saiu da sala no momento, e, fingindo não prestar qualquer atenção ao agente de polícia, dirigiu-se diretamente ao jovem médico. —Stern, quantas doses de adrenalina injetou nela?? —4 vezes 5 miligramas — respondeu o interno. O professor o repreendeu de imediato, lembrando-o que esse modo de agir indicava obsessão terapêutica; depois, dirigindo-se ao oficial de polícia, afirmou que Vanessa estava morta, muito antes do Dr. Stern ter certificado a hora de seu falecimento. Acrescentou que o erro da equipe médica provavelmente havia sido empenhar-se em fazer funcionar o coração daquela paciente com doses altas. Para resolver qualquer possível debate, explicou que o líquido injetado havia se acumulado ao redor do pericárdio. E, quando você freou bruscamente, passou para o coração, que teve uma reação puramente química e que se colocou em marcha. Desgraçadamente, aquilo em nada mudava a morte cerebral da vítima. Com referente ao coração, quando o líquido se dissolvesse, pararia. —No caso de que já não tenho ocorrido , acrescentou. Fernstein convidou o policial a pedir desculpas ao dr. Stern por seu nervosismo, totalmente fora de lugar, e pediu a este último que fôsse vê-lo antes de sair. O agente se voltou para Philips. —Vejo que na polícia não temos o monopólio do corporativismo. Não lhe desejo que passe um bom dia. Ato seguido, girou sobre seus calcanhares e abandonou o recinto do hospital. As portas se fecharem atrás dele,e, cerrou as portas do furgão com violência. Stern se abaixou, os braços apoiados no balcão, olhando a enfermeira de plantão, franzindo o cenho. —Mas, o que é toda esta confusão que você contou? A mulher balançou os ombros e lembrou-lhe que Fernstein o esperava. Philip foi à porta do chefe de Vanessa. Foi convidado a entrar. De pé, por trás da mesa, de costas e olhando pela janela, esperava, ostensivamente que Stern falasse primeiro, coisa que foi feita. Confessou que não entendia o que havia dito o policial. Fernstein o interrompeu:
—Escuta-me bem, Stern. O que eu dei a este oficial foi a explicação mais simples para que não haja uma informação sobre você que possa destruir sua carreira. Seu comportamento é inadmissível para alguém com sua experiência. Tem que saber aceitar a morte quando ela chega. Não somos deuses ou responsáveis pelo destino. Esta moça estava morta quando vocês chegaram, e, sua obstinação poderia podido custar-lhe caro. —Mas como explica que tenha começado a respirar de novo?? —Nem o explico, nem tenho porque fazê-lo. Não sabemos tudo. Está morta, dr. Stern. Que isso não o agrade é uma coisa, mas o certo é que ela se foi . Estou me lixando que os pulmões se movam e que o coração palpite por sua conta. Seu eletroencéfalogramo está certo. Sua morte cerebral é irreversível. Esperaremos que o resto siga o mesmo caminho e a enviaremos ao necrotério. Ponto final. —Mas... Não pode fazer isso! Não pode fazê-lo com tantas evidências! Fernstein expressou sua irritação com um gesto de cabeça e elevando a voz. Não tinha porque receber lições. Sabia Stern o custo de um dia de reanimação? Acreditava que o hospital iria ocupar um leito para manter artificialmente, com vida, um “vegetal”? Convidou-o, com eloqüência a raciocinar um pouco. Achava injusto que uma família tivesse que passar semanas inteiras junto à cabeceira de um ser inerte e sem inteligência, mantido com vida, graças às máquinas. Negava-se a ser responsável por tal tipo de decisões, simplesmente para satisfazer o ego de um médico. Ordenou a Stern que desaparecesse de sua vista e que tomasse uma ducha. O jovem interno ficou de pé, plantado frente ao professor, defendendo com ardor, sua postura. Quando certificara a morte, sua paciente estava com parada cardiorrespiratória havia dez minutos. Seu coração e pulmões tinham deixado de viver. Assim, ficara obcecado, porque desde que era médico, notara que alguém, aquela mulher, não queria morrer. A descreveu como, se através de seus olhos abertos, a tivesse sentido lutar, negar a ir-se. Então, havia lutado junto com ela, pulando normas, e, dez minutos mais tarde, contra toda a lógica, contra tudo o que haviam ensinado, seu coração havia começado a palpitara novamente, seus pulmões a inspirar e a espirar o ar, um sopro de vida. —Tem razão — prosseguiu —, somos médicos e não sabemos tudo. Essa mulher também é médica... Pediu a Fernstein que lhe desse uma esperança. Tinha visto comas com mais de seis meses que retornaram à vida, sem que não se entendesse como. O que ela tinha feito nunca ninguém fizera antes, assim era igual ao que custara. —Não deixe que se vá, não quero. É o que ela está nos dizendo. O professor esperou alguns instantes antes de responder. —Dr. Stern, Vanessa era minha aluna. Tinha um caráter rebelde, mas, um grande talento. Eu a admirava muito e tinha grandes esperanças em sua carreira, como também tenho na sua. Esta conversa terminou. Stern saiu do consultório sem fechar a porta. Philip o esperava no corredor.
—O que você faz aqui? —Mas, pode-se saber o que você tem na cabeça, Philip? Você sabe com que você estava falando neste tom? —Você dirá. —O homem com quem você falava era o professor dessa moça, a conhece e ensinava-a nos últimos quinze meses. Salvou mais vidas do que você, talvez possa salvar em toda a sua. Você tem que aprender a se controlar. A verdade é que às vezes você delira. —Deixe-me em paz, Frank. Hoje já recebi minhas doses de lições de moral.






Demorooou mas chegou....(:
comentem por favor *-*
Beijus

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